Amazônia perdeu mais de 50 milhões de hectares em 38 anos

Área corresponde a 13% da floresta que, apesar da ação humana intensa, permanece como a maior floresta natural do país
Foto: Christian Braga/ Greenpeace

Por Yasmim Tabosa, PIM Amazônia

Levantamento do projeto MapBiomas divulgado nesta sexta-feira, 20, mostra o avanço da perda florestal no Brasil, entre 1985 e 2022, com destaque para a Amazônia. O bioma perdeu mais de 50 milhões de hectares (13%) em 38 anos. Porém, 78% de seu território ainda é formado por florestas naturais, sendo o bioma com a maior proporção de florestas naturais do país em 2022, seguido pela Caatinga (54%).

O mapeamento de florestas naturais abrange tipos diversos de cobertura vegetal, são elas: formações florestais, savanas, florestas alagáveis, mangue e restinga. Juntos, esses ecossistemas ocupam 58% do território nacional. Os dados fazem parte do estudo publicado na Coleção 8 do Mapeamento Anual da Cobertura e Uso da Terra no Brasil realizado pelo MapBiomas. De acordo com o relatório, o Brasil perdeu, em 38 anos, 15% de suas florestas naturais.

Acesse os destaques das florestas no Brasil entre 1985-2022

Dentre os tipos de coberturas vegetais, é importante destacar as formações florestais, que correspondem a vegetação com predomínio de espécies arbóreas e dossel contínuo, como as florestas que tipicamente predominam na Amazônia e Mata Atlântica. No total, esse tipo de vegetação cobria 43% do território nacional, em 2022, sendo a classe de floresta mais representativa em área no Brasil, com 369,1 milhões de hectares. O dado representa três vezes o tamanho do estado do Pará.

A Amazônia é o território que abrange de maneira mais expressiva as formações florestais. Para se ter ideia, do território total, 308 milhões de hectares, ou 84% do total, estão na Amazônia – que também responde por 86% da supressão florestal detectada nessa categoria entre 1985 e 2022.

Foto: Valdemir Cunha/ Greenpeace

Há formação florestal nos demais biomas do Brasil, porém em proporção muito menor: 13% do Cerrado (25 milhões de hectares), 4% da Caatinga (3 milhões de hectares), 16% do Pantanal (2,4 milhões de hectares) e 11% do Pampa (2,2 milhões de hectares). Todos os biomas perderam área de formação florestal nos últimos 38 anos, com exceção do Pampa, que se manteve estável.

O MapBiomas é uma iniciativa do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa do Observatório do Clima e é produzido por uma rede colaborativa formada por ONGs, universidades e empresas de tecnologia.

Além de formações florestais, Amazônia também abriga as florestas alagáveis

A Amazônia abriga também florestas alagáveis – categoria que o MapBiomas passou a monitorar a partir deste ano nesse bioma. São formações que se estabelecem ao longo de cursos d’água, ocupando as planícies e terraços periodicamente ou permanentemente inundados, que adquirem fisionomias de matas de várzea e matas de igapó. Entre 1985 e 2022, foram perdidos 430 mil hectares de florestas alagáveis na Amazônia, onde ocupavam 18,8 milhões de hectares ou 4,4% do bioma em 2022.

“As florestas alagáveis da Amazônia fornecem diversos serviços ecossistêmicos essenciais. Elas abrigam uma biodiversidade única, atuam como sumidouros de carbono, regulam o ciclo hidrológico e a vazão dos rios. Além disso, mantêm habitats aquáticos e oferecem recursos naturais para comunidades locais. No entanto, esses ecossistemas enfrentam graves ameaças, decorrentes principalmente da atividade humana, como desmatamento, mineração, construção de infraestrutura, mudanças climáticas, queimadas, exploração madeireira não sustentável e poluição da água. A proteção e gestão sustentável dessas áreas são cruciais para a preservação da biodiversidade, a manutenção dos serviços ecossistêmicos e a integridade desses ecossistemas únicos na região amazônica”, destaca Luis Oliveira Jr. pesquisador da equipe da Amazônia no MapBiomas

A quase totalidade (95%) da conversão de florestas naturais no Brasil foi para a agropecuária, ou seja, após o desmatamento, a área foi convertida para uso agropecuário – seja pastagens ou cultivo agrícola. Nas duas primeiras décadas da série, observamos um aumento da perda de florestas, seguido de um período de redução da área desmatada a partir de 2006. No entanto, nos últimos cinco anos houve um aumento da perda de florestas, chegando a quase 10 milhões de hectares.

“As florestas são importantes não apenas para manter o equilíbrio climático, mas também para proteger os serviços ecossistêmicos vitais para a sociedade e sua economia. A perda contínua das florestas representa uma ameaça direta para a biodiversidade, a qualidade da água, a segurança alimentar e a regulação climática”, salienta Julia Shimbo, Coordenadora Científica do MapBiomas.

Formação savânica suprimiu 700 mil hectares por ano

A formação savânica cobre 12% do território brasileiro, ou 104,5 milhões de hectares – o equivalente a três vezes o estado de Goiás. Esta formação, que se caracteriza pela vegetação com espécies arbóreas distribuídas de forma mais esparsa e em meio à vegetação herbácea-arbustiva contínua, é a segunda classe de floresta natural mais representativa em área no Brasil e, proporcionalmente, a que teve o maior desmatamento. Entre 1985 e 2022 a perda de formação savânica totalizou 29 milhões de hectares ou 22% em relação à área existente em 1985. O ritmo de devastação foi de aproximadamente 700 mil hectares por ano. De cada cinco hectares desmatados, mais de quatro (83%) foram suprimidos no Cerrado. Na Caatinga, a perda foi de 10% (4,7 milhões de hectares).

A coordenadora científica do Map Biomas, Júlia Shimbo, explica que embora a Amazônia e o Cerrado sejam os biomas que mais perderam área de floresta nos últimos 38 anos, foi o Cerrado o que mais perdeu proporcionalmente. Quase um terço de sua área de floresta, 29 milhões de hectares, foram desmatados, sendo a maior parte das formações savânicas convertidas, principalmente, para agropecuárias. 

“A formação savânica é a vegetação típica do cerrado, e que além das florestas, também desempenha um papel fundamental na regulação climática e hídrica. Consequentemente, sua perda pode afetar a força hídrica, energética e alimentar do país. Precisamos buscar estratégias para ampliar a conservação das florestas, mas também das savanas brasileiras. Reduzir drasticamente o desmatamento e ao mesmo tempo restaurar as áreas degradadas”, informa a especialista.

Mais da metade da formação savânica (53%) fica no Cerrado. O restante fica na Caatinga (42%) e demais biomas (5%), com exceção do Pampa. Em 2022 havia 1,5 milhão de hectares na Amazônia (0,4% do bioma), 1,3 milhão de hectares na Mata Atlântica (1% do bioma) e 2 milhões de hectares no Pantanal (16% do bioma). As formações savânicas correspondem a 28% do Cerrado (56 milhões de hectares) e metade do território da Caatinga (44 milhões de hectares).

“Em biomas como no Cerrado e na Caatinga, que já perderam parte significativa de sua vegetação nativa, o ritmo do desmatamento das savanas é alarmante, principalmente na região do Matopiba, que ainda apresenta grandes remanescentes deste ecossistema, mas que estão sendo convertidos para a expansão da agropecuária”, destaca a pesquisadora da equipe do Cerrado no MapBiomas, Barbara Costa.

Manguezais se caracterizam com uma das poucas vegetações estáveis

No caso dos manguezais – classe de vegetação que pode ser encontrada em toda a costa brasileira, com exceção do litoral gaúcho – a área total permaneceu estável, em torno de um milhão de hectares, porém com variações regionais: estabilidade na Amazônia e reduções localizadas no Nordeste e Sudeste do país.

Área de mangue no Amapá. Foto: Victor Moriyama/ Greenpeace

“Apesar da estabilidade em escala nacional, não podemos esquecer que os manguezais são distribuídos de maneira desigual no país – concentrados principalmente na região Norte. Há, portanto, a necessidade de se pensar estratégias distintas para a preservação destes ecossistemas. No Norte pensamos em conservação, ao passo que no nordeste e sudeste, necessitamos de estratégias de restauração”, explica César Diniz, coordenador técnico do mapeamento do tema de Zona Costeira do MapBiomas.

Brasil perdeu 10% da sua área de restinga arbórea

Já a restinga arbórea – formação florestal que se estabelece sobre solos arenosos e dunas na zona costeira e que pode ser encontrada desde Alagoas até o Rio Grande do Sul – perdeu 69 mil hectares (10%) nos últimos 38 anos, passando de 696 mil hectares em 1985 para 626 mil hectares em 2022. No ano passado, 88% da área de restinga estava na Mata Atlântica e 12% no Pampa.

“Apesar da sua área restrita na costa brasileira, a restinga tem sido convertida para atividades agropecuárias, como pastagens, agricultura e silvicultura, além da expansão urbana. Essa conversão impacta a biodiversidade, espécies endêmicas, a proteção de ecossistemas costeiros, como dunas e praias e afeta outra função importante dessa formação, que é servir como barreira ao avanço do mar”, comenta Natália Crusco, coordenadora técnica da Mata Atlântica do MapBiomas.

Em 2021, 8% das florestas naturais cresceram em áreas desmatadas

A análise dos mapas anuais de cobertura e uso da terra desde 1985 do MapBiomas permite identificar as florestas secundárias, ou seja, as florestas que voltaram a crescer em áreas desmatadas. Em 2021, elas ocupavam 41 milhões de hectares em todo o Brasil, o equivalente a 8% das florestas naturais do país.

Os biomas com maior proporção de florestas secundárias são a Mata Atlântica e a Caatinga, com 27% cada (8,1 milhões de hectares e 12,5 milhões de hectares, respectivamente), seguidos pelo Cerrado (12% do bioma, ou 10 milhões de hectares), Pantanal (8% do bioma, ou 100 mil hectares), Amazônia (3% do bioma, ou 9,8 milhões de hectares) e Pampa (2% do bioma, ou 300 mil hectares). Com exceção da Mata Atlântica e Caatinga, elas não são o principal alvo do desmate nos biomas brasileiros: cerca de 70% da supressão vegetal em florestas naturais entre 1985 e 2022 se dá em áreas de florestas primárias. No caso da Amazônia, esse percentual é de 82%.

“Na Mata Atlântica mais da metade do desmatamento é em vegetação secundária (63%). Considerando a devastação histórica do bioma mais desmatado do país, hoje temos menos de um terço da sua cobertura original preservada. Nos últimos anos é possível observar que, além de ainda perder áreas de florestas primárias, estamos perdendo oportunidades de recuperar a cobertura florestal. Essas áreas em recuperação são novamente desmatadas antes que possam se consolidar e fornecer os serviços ecossistêmicos (água, qualidade do ar, biodiversidade, etc.) essenciais para recuperação da Mata Atlântica”, destaca o coordenador técnico do MapBiomas, Marcos Rosa.

Os estados com maior proporção de floresta estão Amazonas (93%), Acre (85%) e Amapá (82%). O estado do Amazonas também apresenta a maior área de floresta com 145 milhões de hectares, quase um terço das florestas do país (29%), seguido do Pará (93 milhões de hectares) e Mato Grosso (47 milhões de hectares). A área de floresta desses três estados representa mais da metade da área das florestas brasileiras (58%). Mas Mato Grosso e Pará também lideram os estados que mais perderam área florestal natural, com 31,4 milhões de hectares e 18,4 milhões de hectares respectivamente. Já os estados de Rio de Janeiro e São Paulo ganharam área de floresta entre 1985 a 2022.

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