Gestão da Amazônia, o gargalo e a saída

Entrevista com Augusto César Barreto Rocha, Doutor em Engenharia da Produção e Conferencista da I AMAS, o Congresso de Gestão da Amazônia

 

USP e UEA, a Universidade do Estado de São Paulo, o mais rico do país, em parceria com a Universidade do Amazonas, o Estado da federação mais agraciado de recursos naturais, promovem uma conferência de Gestão da Amazônia, que começa nesta quarta-feira, e que teve como base um evento promovido por CIEAM e FIEAM, no desfecho da Mostra dos Pioneiros e Empreendedores do Brasil e do Amazonas num Seminário sobre o Futuro. “O que os Pioneiros do Amazonas poderiam recomendar para o futuro de nossa terra”. Isso se deu em 05/08/2013, e reuniu 70 pessoas, representando 35 instituições… Incluindo cientistas, empresários e órgãos de fomento. Sobre o evento, o empresário e professor da UFAM, um palestrante da Conferência, nos deu a seguinte entrevista.

 

FOLLOW-UP: Qual a importância deste debate em Manaus, de origens amazônicas e influenciado pelos pioneiros do país e do estado, se pensarmos no futuro em termos de desenvolvimento e nas prioridades sociais?

 

AUGUSTO ROCHA: Mantidas as condições atuais da proteção pela proteção, que chamo de Protecionismo em minhas reflexões, essas reflexões levarão a um futuro que repetirá o passado: identificamos a alternativa econômica da borracha e ela foi levada para o exterior. Identificamos o Tambaqui e ele também foi levado para o exterior, e produzido em grande escala. Nos produtos do futuro acontecerá o mesmo. Não há porque esperar um futuro diferente se for mantido o protecionismo que agrada ao interesse de outros. Mantido o modelo atual, e nada fizermos, a floresta será destruída e usurpada pouco a pouco, sem proveito algum para o Brasil.

 

FUP: Por que e como se dá essa omissão coletiva?

 

AR: Comparo como andar com R$ 1 mil, US$ 1 mil ou EUR 1 mil nas mãos e a vista de todos em um ônibus. Quem faria isso em Manaus, Rio de Janeiro, Nova York ou Paris? Isso não é algo seguro. Mas é o que temos feito com os achados: demonstrado eles na Internet, eventos e por aí a fora, facilitando, incitando e estimulando a biopirataria e outros crimes difíceis de serem coibidos. Se não houver um cuidado mínimo e uma velocidade máxima para realizar a riqueza, o que acontecerá é o mesmo que aconteceu. Precisamos antes de tudo entender que riquezas precisam ser protegidas e realizadas.

 

FUP: O debate proposto pela Conferência vai cumprir qual papel?

 

AR: Vejo que a importância do encontro é construir propostas para a mudança da lógica atual. Precisamos aceitar que a forma de gestão que temos hoje é desinteressante para a região. Enquanto não houver esta aceitação e a ideologia não for transformada para uma Proteção Consciente, associada a produção, não sairemos deste emaranhado de barreiras que são feitas para estimular o nada fazer. Sem uma reflexão de alto nível que construa rotas de saída, ficaremos presos em um labirinto inútil para o país e para a humanidade.

 

FUP: A relação academia e economia no Amazonas se aproxima de um entrelaçamento e uma parceria muito pródiga. Infelizmente, embora Manaus tenha sido – com a Universidade Livre de Manaus – a primeira instituição acadêmica do Brasil, quando se implantou em 1906 nós estávamos nos estertores do ciclo da borracha. Que futuro você vislumbra em termos de inovação com essa tematização da academia com a economia para qualificar a gestão da Amazônia?

 

AR: Não concordo com o formato atual. A relação da academia com a indústria em nosso estado é pífia. Quantos por cento de nosso PIB é gerado a partir desta relação? Quase nada? Qual a métrica? Temos pessoas trabalhando em postos de gestão e de operação nas empresas locais. Isso é criação de mão de obra… Este é o lado operacional. Importante, mas não suficiente para o que se espera da universidade moderna. Criar riqueza na academia é quase um crime na ideologia atual. Muito pouco dos produtos em grande escala que são produzidos no Polo Industrial de Manaus foram concebidos aqui. A maior parte vem de centros de pesquisa do exterior.

 

FUP: Quais os sintomas benéficos desta relação?

 

AR: Acreditarei que há entrelaçamento quando uma parcela expressiva de nossa economia advier desta relação. Quando ao menos 30% dos produtos vendidos tenham tido TODO seu ciclo de desenvolvimento na região ou que tenham tido todos os insumos da natureza amazônica. Enquanto isso não acontecer não poderei concordar com a assertiva inicial. A tematização tem que sair do Protecionismo para a Proteção. Depois passar para o Desenvolvimento de Tecnologias de todos os tipos usando insumos locais. Quando tivermos uma concorrência ampla de 1/5 dos nossos alunos vindos de outros países e formos um centro de atração de mentes brilhantes do mundo, poderemos dizer que estamos fazendo algo relevante. Em Cingapura, 29,5% dos estudantes eram estrangeiros durante 2015. Em faculdades norte-americanas de ponta, como o MIT, no ano passado 30,43% dos estudantes eram estrangeiros. Nosso número hoje está abaixo de 1%. Temos um longo caminho a percorrer, o que é ótimo: uma bela oportunidade.

 

FU: Você tem dito que os recursos naturais do Amazonas e da Amazônia são mais apologia do que realidade. Gostaria que você descrevesse um pouco como a academia pode transformar a potencialidade dos recursos em efetividade econômica, industrial e efetividade de um desenvolvimento sustentável?

 

AR: A academia poderá transformar a realidade assim que existirem empresários locais que acreditem na ciência como um possível local para encontrar um jeito de ganhar mais dinheiro. Hoje a academia está voltada para os seus problemas, sem olhar o mundo e os empresários também. Um de costas para o outro. Não há uma aproximação. Os poucos empresários e os poucos detentores de capital devem caminhar até as academias com humildade de quem precisa de apoio. De sua parte, os cientistas precisam descer de seus pedestais de marfim e caminhar para os empresários com humildade de quem precisa de recursos. Ambos devem aceitar os defeitos dos outros e construir soluções para um mundo desejado, bom para os dois lados. Riqueza de inovação tecnológica não se constrói sozinho. Enquanto não houver um reconhecimento que os métodos atuais estão errados, será impossível este diálogo. Nossas barreiras estão 90% nas mentes e 10% nas regras que nos auto impusemos.

 

FUP: Pensando no dia seguinte, o que você como conferencista integrante de um time de vanguarda. Como você descreve o dia seguinte deste evento e desta aproximação USP UEA no doutoramento de novos gestores da Amazônia?

 

AR: Meu temor é que o evento repita os modelos mentais atuais. A minha esperança: que sejam plantadas sementes para um futuro desenvolvido da região, com o início de uma troca de ideias e identificação de prioridades, onde o norte de todos seja desenvolver e gerar riqueza a partir do potencial que existe. A minha proposta é que cada cidade escolha apenas cinco produtos para juntar em torno deles as mentes brilhantes do mundo da ciência e empresarial para produzir aqui esta riqueza. Isso é importante para os seres humanos. Não pode haver utopia mais interessante para perseguirmos.

 

 

Esta Coluna é publicada às quartas, quintas e sextas-feiras, de responsabilidade do CIEAM. Editor responsável: Alfredo MR Lopes. [email protected]

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