Auxílio-alimentação custa R$ 43 milhões aos cofres públicos em 2016

Enquanto uma média de 2,5 mil funcionários da Assembleia Legislativa do Amazonas recebem R$ 1,2 mil por mês referente ao abono, professores da Seduc recebem R$ 220

De Manaus – Texto: Henrique Saunier para Revista PIM Amazônia

Com 24 deputados eleitos, a Assembleia Legislativa do Estado do Amazonas (ALE-AM) empenhou um total de R$ 43 milhões dos cofres públicos, em 2016, para fornecer auxílio-alimentação aos aproximados 2,5 mil servidores que compõem o órgão. O valor representa mais de 27% dos R$ 156 milhões que a casa precisou para custear os gastos com a folha de pagamento dos seus funcionários.

Segundo informações da própria ALE-AM, uma média de 2,5 mil funcionários receberam mensalmente uma quantia de R$ 1,2 mil referente ao abono, oferecido nesta modalidade desde 2003. Outras categorias da esfera estadual recebem valor bem abaixo do auxílio pago na assembleia, como é o caso dos professores e demais servidores da Secretaria de Estado de Educação (Seduc), cujo tíquete com o mesmo fim é de apenas R$ 220.
Ao multiplicar o valor mensal pago (incluindo uma parcela extra de bonificação natalina) pela quantidade de funcionários informada pela ALE-AM, chega-se a um total de R$ 39 milhões, R$ 4 milhões a menos da cifra que consta no relatório do Portal da Transparência do governo do Estado. No entanto, o montante do relatório fechado de 2016 também inclui o pagamento residual de parcelas atrasadas do exercício do ano anterior (2015), feito após protesto de servidores contra o atraso e fracionamento do benefício, em fevereiro do ano passado.

A falta de informação da quantidade exata de servidores da Assembleia que receberam o benefício, inclusive no próprio Portal da Transparência, prejudica o entendimento total do gasto. Questionada sobre o assunto, a Diretoria de Comunicação da ALE-AM afirmou que o número varia todos os meses de acordo com a necessidade do parlamento. “Você pode trabalhar com uma média de 2,5 mil servidores, entre efetivos e comissionados. Média, nunca número exato”, enfatizou a nota de resposta.

A Assembleia completou sua resposta afirmando que “se encontra dentro dos limites legais de pagamento de pessoal, seguindo o que determina a lei de responsabilidade fiscal” e ressaltou que \”a variação do valor depende da quantidade de servidores comissionados contratados pelos gabinetes e, como este número é flutuante, o pagamento de benefício alimentação também flutua’’.

O auxílio-alimentação se mantém em R$ 1,2 mil desde 2014 para todos os servidores comissionados e concursados e não é pago aos parlamentares. Antes disso, o benefício já foi de R$ 1,1 mil (2013), R$ 1 mil (2012) e R$ 260 (2004). A espécie de bonificação é amparada pela Resolução número 225 de 1994, que criou o tíquete alimentação.

Atualmente, os salários na ALE-AM variam de R$ 900 para os agentes de segurança, passando por R$ 11 mil para os cargos de diretorias de departamentos, até R$ 24 mil para procurador-geral. Este último é o maior vencimento registrado na folha do órgão.
Os documentos divulgados para consulta pública mostram que houve um incremento de 29%, cerca de R$ 10 milhões, no montante pago aos funcionários anualmente desde 2012, quando o gasto da casa nesta despesa era de R$ 33, 5 milhões. Nos últimos quatro anos, a assembleia aumentou seu quadro de colaboradores por meio de concurso público (realizado em 2011) que aprovou 132 candidatos.

\"\"RESPONSABILIDADE FINANCEIRA

De recesso parlamentar, o presidente da ALE-AM, Josué Neto, comentou por meio de assessoria o assunto e disse que o valor despendido segue um padrão adotado por outros órgãos e não acredita que a soma esteja fora da realidade. “Instituições similares, como o Tribunal de Contas do Estado praticam valores parecidos, mas o principal é que o benefício está dentro da legalidade e responsabilidade financeira\”, afirmou o presidente da casa. Josué Neto também comentou o fato de o benefício ser pago por meio de depósito bancário juntamente com o salário dos servidores e não por meio de cartão, como acontece com funcionários públicos de algumas secretarias Estaduais. “Todas as nossas decisões são baseadas em primeiro lugar na legalidade, depois na responsabilidade. Um gestor também tem que pensar no bem estar do servidor, e 40 reais diários de vale alimentação é um valor dentro da realidade, haja vista que em um período de 6h ou 8h deve se fazer duas refeições’’, completou Josué Neto.

No Brasil, Tribunais de Contas estaduais já mostraram preocupação quanto a incrementos nos salários por meio de auxílios criados para burlar a Lei de Responsabilidade Fiscal, o que não seria o caso da ALE-AM, de acordo com o parlamentar.

Responsáveis por acompanhar os gastos dos parlamentares e da assembleia, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) e Ministério Público de Contas (MPC) não comentaram o assunto devido ao recesso na instituição.

Sobre o tema, o Ministério Público do Estado do Amazonas (MP-AM) informou que o Centro de Apoio Operacional de Proteção e Defesa dos Direitos Constitucionais do Cidadão, dos Direitos do Consumidor e da Defesa do Patrimônio Público (CAO-PDC) não recebeu nenhuma denúncia e admitiu não acompanhar os gastos. \”Não há qualquer procedimento ou investigação nesse sentido\”, diz a breve resposta do órgão.

Gasto com pessoal consome 75% das despesas
De acordo com o relatório de pagamentos, que traz todos os gastos da casa separados por tipo de despesa e por deputado, a folha de pagamento de servidores da ALE-AM consome 75% de tudo o que foi desembolsado da conta do órgão, R$ 207,7 milhões no total. O valor, entretanto, respeita o percentual de 1,77%, previsto pela Lei de Responsabilidade Fiscal, que limita as despesas com pessoal do poder legislativo em relação a receita corrente líquida do Estado.

Dentro dos R$ 156 milhões empenhados pelo poder legislativo estadual para pagamento de pessoal, incluem-se ainda os gastos com vencimentos e salários, auxílio-transporte, pensões militares e aposentadorias. Os dados constam no Portal da Transparência, mantido pelo Governo do Estado. A ferramenta não disponibiliza quantos e quais servidores têm acesso ao benefício.
O custo com benefício de auxílio-alimentação na ALE-AM tem se mantido nos mesmos patamares nos últimos anos. No ano anterior, 2015, o vale demandou R$ 41,3 milhões dos cofres públicos, contra R$ 41,1 milhões em 2014 e R$ 38,1 milhões em 2013.

A revista PIM Amazônia procurou a atual presidente da Associação dos Servidores da Assembleia Legislativa do Amazonas (Assale), Silvete da Silva – que também é psicóloga do setor de Recursos Humanos do órgão – para comentar o assunto, mas se esquivou das tentativas da reportagem em abordar o tema via telefone. A presidente da Assale frisou por diversas vezes que não falaria com a equipe de reportagem por não conhecer quem estava ligando para ela, mas também recusou o convite para conversar pessoalmente com a publicação. “Não gosto de dar entrevistas, eu ajudo os servidores internamente. Não tenho medo de me comprometer, mas todas as informações estão no Portal da Transparência’’, disse Silvete.
Silvete salientou apenas que “o servidor recebe todo mês o vale refeição, (pois) é de direito, é lei”. Antes do fim do contato, ela reforçou que por mais que fosse presidente da Associação, não poderia dar mais informações, pois isso fazia parte do seu “sigilo profissional”.

Na avaliação do economista e coordenador dos cursos de Ciências Econômicas e Organização de Serviços Judiciários do Centro Universitário de Ensino Superior do Amazonas, Samuel Appenzeller, a transparência é primordial para qualquer tipo de gestão, principalmente quando o assunto envolve valores elevados de dinheiro público.

“Se não tiver transparência, denota que você não está realmente utilizando aquela receita naquilo que se propõe’’, analisou o economista, que também defende o enxugamento da máquina pública. “Os valores pagos para um deputado são estratosféricos, assim como o custo que ele tem. Nós pagamos um alto valor de imposto porque o custo da máquina pública é muito alto. Mas precisa não só enxugar, mas mudar o conceito de gestão”, destacou Appenzeller.

O economista reforçou que, além de responsável, a gestão de gastos públicos precisa ser transparente, o que, para Appenzeller, o Estado ainda não faz de maneira satisfatória.

 

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